A massa como audiência 

Ao nos colocarmos a pensar sobre o papel da sociedade de massa no mercado de arte, podemos encará-la de três formas distintas. A primeira é como a audiência global, na qual todo e qualquer artista que tem a pretensão de fazer com que seu trabalho transcenda a reflexão e traga uma mudança na sociedade, busca atingir/chamar a atenção com o seu trabalho. Um exemplo disso foi a obra Vale (baleia) do coletivo belga Captain Boomer. Nela uma baleia hiper-realista foi colocada às margens do rio Sena, como cita a notícia de Márcia Bechara: 

O coletivo Captain Boomer, criado em 2007 na Antuérpia, na Bélgica, […]. Em seu site, o grupo diz que a baleia é uma “metáfora gigantesca de destruição do nosso ecossistema.” “Em contato com a obra, as pessoas sentem que a ligação com a natureza foi perturbada. O jogo entre ficção e realidade reforça essa sensação de desordem”, explicam os artistas belga. […] segundo o coletivo, trata-se de um trabalho de dimensão educativa. “Durante essa instalação, quando a ‘baleia’ encalha, acontece uma forte interação com o público”, diz o grupo em seu site. “Isto atrai e mobiliza a comunidade local. As pessoas falam, especulam as causas do encalhe e admiram o animal”, explica o grupo Captain Boomer

No caso, podemos notar uma preocupação em impactar a maior quantidade de pessoas possível. Os efeitos “colaterais” desse tipo de ação são: a relevância e a procedência que o grupo passa a levar consigo.  

  1. A MASSA COMO MENSAGEM E PúBLICO ATRELADO   

Em um segundo caso, podemos entendê-las como motores da indústria cultural, isto é, podem, por um lado, não necessariamente adquirir as obras originais, mas, por outro, compram diversos subprodutos das obras, que vão de canecas e chaveiros a reproduções numeradas das peças – que garantem ao artista um espaço no imaginário popular. Um exemplo disso são as diversas linhas de produtos de Romero Brito, que, segundo nota na revista Dinheiro possuía na época (2011) mais de 200 produtos licenciados.

“É impressionante o sucesso de Romero Britto, que possui mais de 200 produtos licenciados com sua marca. Além da galeria, que faz muito sucesso, na Lincoln Road, em Miami Britto tem três lojas nos navios da Royal Caribbean e outras nos aeroportos da Florida: até 2013, serão dez. Romero Britto terá exposições em novembro e dezembro em Viena, Londres. Berlim e Munique. Suas telas podem custar de US$ 30 mil até US$ 500 mil. Aos 48 anos, este pernambucano é um talento da pop art e na arte de ganhar dinheiro.” (Ferreira, C. Lideres. Revista Dinheiro, São Paulo, p. 28, nov. 2011. Editorial)  

Podemos, aqui, fazer uma analogia do conceito de Benjamin, no qual o autor desenvolve a dinâmica entre o valor de culto e valor de exposição; com Britto, a estratégia é utilizar de toda ”munição“ possível dentro da indústria cultual para se destacar através do culto, desenvolvendo um sistema Desejo/Exclusividade, no qual o principal atributo de sua obra é atestar o poder.

Nesse sentido, podemos entender a criação de subprodutos com pouco ou nenhum lucro, como agentes “educativos” para “evangelização” da massa. Em outras palavras, “uma maneira de ensinar a massa sobre aquilo que a “oprimirá” e o que deve ser considerado um objeto de poder”. Além do desenvolvimento de produtos, Britto também é conhecido por presentear pessoas de grande poder e destaque com retratos. Entre os nomes estão Michael Jackson, Princesa Diana, Dalai Lama, Jeff Koons, John F. Kennedy e Jacqueline Kennedy, Dilma Roussef, Barack Obama, Mao Tsé-Tung10 e tantos outros. 

Ao presentear esses “influenciadores”, Britto forma no imaginário de seus compradores, um perfil de seu público consumidor; é como se adotasse um discurso que mostra o “cacife” – no sentido mais pleno do termo, que, por um lado, para grande massa, garante o status do artista como notório, e, por outro, para os colecionadores, novos e emergentes, se reafirma como um símbolo e uma marca de poder, legitimadora de status e pertencimento. 

Da mesma forma que na era absolutista um rei católico legitimava o poder da igreja, e, ao mesmo tempo, a igreja provia legitimidade para o rei – alegando que Deus o havia escolhido para o cargo, no mercado de arte não é diferente. Quando um artista (assim como a Igreja) garantir legitimidade (pertencimento) a um rei (colecionadores de marca/mercado), a Igreja (artista) terá uma nação de fiéis (massa) e uma classe burguesa (colecionadores emergentes) como sua vassala.  

Britto também trabalha com diversos outros tipos de ações e projetos especiais que vão desde rótulos de bebidas , jogos de tabuleiros, incontáveis esculturas, personalização de carros e aberturas monumentais de eventos (Super Bowl) . Todas essas ações fazem com que a massa conheça e reconheça Britto e suas obras. Parte do sucesso de sua estratégia está relacionado ao uso de símbolos (marcas e eventos) já consagrados para as massas como Super Bow 19, Audi e o Carnaval do Rio de Janeiro. 

  1. A ARTE COMO DISCURSO POLíTICO/IDEOLÓGICO 

Já em um terceiro caso, podemos entendê-las (massas), ainda, como motores da indústria cultural, mas nesse caso, diferentemente da “imparcialidade” de Britto, busca-se um discurso político/ideológico. Nesse cenário, podemos citar o artista VIk Muniz.

Muniz possui como característica o uso de materiais reciclados – não necessariamente sucata – como matéria prima do seu trabalho, sua obra deriva desde serigrafias, fotografias e esculturas, até documentários. ” Seu processo de trabalho consiste em compor as imagens com os materiais, normalmente instáveis e perecíveis, sobre uma superfície e fotografá-las” (Escritório de Arte).

Sobre seu início de carreira escreveu Carlos von Schmidt em 2001: 

“De volta aos tempos da molduraria, paralelo às pinturas kitsch que fazia para ganhar uns cobres a mais, começou a fazer esculturas, estranhas e incomuns. Foram essas esculturas que abriram-lhe (sic) as portas do circuito de arte nova-iorquino. Fotografá-las para poder mostrá-las a possíveis interessados, levou-o à fotografia. “ (Bolsa de Arte)

Dentro da perspectiva da formação de marca, Muniz foca em um “segmento” muito mais voltado ao discurso ecológico do que tão somente ao mercado de arte. 

Como resultado desse posicionamento, tem maior aceitação dentro do mercado de projetos culturais para empresas; que, por sua vez, podem buscar não somente agregar à marca a visão de patrona das artes, mas bem como ao posicionamento de responsabilidade ambiental. Não raras vezes, artistas com esse perfil não se restringem apenas a patrocínio de mostras para o grande público, mas atuam nos mais diversos níveis da empresa, desde obras que decoram os escritórios dos principais executivos, como também suas obras são utilizadas como presentes para estreitar relações com “colaboradores”, até mesmo desenvolver peças com os produtos reciclados da empresa, como por exemplo, a obra exposta no Edifício Conjunto Nacional de Silvio Galvão, denominada de “Dom Quixote de La Mancha” .

Em entrevista ao canal digital Novo Olhar Sandro Rodrigues mestre artesão da obra citou: 

”Essas peças agente consegue em vários lugares na verdade, porque o lixo se encontra em toda parte, mas agente ia muito em deposito, aqui do conjunto nacional saiu grande parte também dos materiais, então agente ia atrás onde precisasse” (grifo nosso).

Notamos aqui, uma proposta muito semelhante à de Muniz, exceto, pelo fato de que o artista não tem desenvolvimento de marca no mercado de arte, o que, do ponto de vista da instituição que encomendou a obra, pode não fazer tanta diferença; falamos isso não como uma maneira de menosprezar ou desvalorizar a arte de Rodrigues, mas dentro do fato de que a mensagem a ser passada pela instituição é muito mais “somos ecológicos” do que “somos cultos e apreciamos a boa arte”. 

Em termos práticos, diretos e nada românticos, isso significa que, nesse caso, não foi necessário gastar infinitamente mais com uma obra de Muniz que, por sua vez, envolveria muitos custos de manutenção, como seguro, restauro, transporte e segurança, além do preço da própria obra – o que resultaria em menos tempo de exposição, culminando em menos impacto para a instituição benfeitora, sendo que a obra de Rodrigues exibe uma estética muito mais “clara e crua” em relação ao que se pretende apresentar. Permite também aproximação física maior do grande público, possui manutenção infinitamente menos burocrática; isso sem mencionar o fato que os visitantes do edifico Conjunto Nacional não reconheceriam, em primeiro momento, que se trataria de um Vik Muniz, o que a instituição buscava nesse caso. Ou por necessidade legal ou por necessidade mercadológica, era um monumento, não necessariamente uma obra prima.

O que buscamos dizer com isso é que, incialmente, quando pensamos em marca no mercado de arte, logo nos vem à mente, grandes artistas internacionais com seus luxuosos catálogos e suas requintadas vernissages, porém, não obstante, os verdadeiros ringues das marcas do mercado de arte estão onde a audiência de cada obra se situa. Isso está muito menos ligado à uma declaração de que o artista deve apenas produzir dentro dos parâmetros esperados pelo mercado e muito mais ligado ao fato de que ele deve contar com uma equipe de profissionais que conheça as diversas demandas, nas quais suas obras se encaixam. 

Nesse cenário, vale trazer a reflexão sobre o debate em relação à singularidade e inovação em sua matize estética. Inicialmente, podemos pensar que manter linearidade estética pode acabar podando a criatividade do artista – já que, ao não experienciar novos materiais, o artista restringe seu potencial, mas ao mesmo tempo não ter qualquer linearidade (estética ou conceitual) , também faz com que perca valor de marca e mercado (há exceções), uma vez que encaremos obras de arte como símbolos de status, “demandam” um acordo entre as partes sobre o valor daquilo que é exibido, nesse caso, a abstenção completa de linearidade  faz com que o entendimento do objeto exposto seja comprometido. Podemos trazer como um exemplo de um artista que mantém por completo sua linearidade como On Kawara como cita Don Thompson (2012, p. 24):  

“Veja-se a atração de uma obra feita pelo artista conceitual japonês On Kawara, cuja série Today [hoje consiste em pintar uma data na tela. Assim, a obra Nov. 8, 1989 (apenas as letras e os números, num bloco branco sobre um fundo preto), em acrílico Liquitex sobre tela, 66 x 91 centímetros, foi vendida por 310 libras em fevereiro de 2006 na Christie’s de Londres. Kawara pinta à mão livre, e se impõe o limite de 24 horas para terminar um quadro. Ele descarta a pintura que não estiver pronta à meia-noite, pois não seria mais a pintura daquele dia. Todas as pinturas são feitas aos domingos. Se Kawara está nos Estados Unidos, a data começa pelo nome do mês em inglês, e a seguir vêm o dia e o ano. Se está pintando na Europa, o dia vem antes do mês. Se está num país que não usa o alfabeto romano, ele escreve o mês em esperanto. Cada venda inclui a primeira página de um jornal daquela data. O catálogo da Christie’s apresenta a obra de Kawara como “uma declaração existencial, uma prova de vida”.  […] Kawara vem fazendo essas pinturas desde 1966. Existem 2 mil quadros do “dia de hoje”. Mas a é uma marca, e seu trabalho de gestão de marca é uma uma referência para todos os marchands contemporâneos e todos os aspirantes a artista conceitual.” 

Por outro lado, temos artistas que não seguem uma linearidade estética, pelos mais variados motivos. Um exemplo disso é o dadaísta Marcel Duchamp, que (simplificando) não objetivava que em sua obra houvesse qualquer sentido, trabalhando, ora com um mictório, ora uma releitura da Monalisa de Leonardo da Vinci.

Nesse cenário, percebemos a importância de bons agentes que têm como função encontrar nichos de mercados para as novas obras, de elaborar estratégias e aparatos para comunicar/apresentar a nova estética ao mercado – tanto aos novos colecionadores, como também aos já experientes. Com isso, podemos aferir que a relação entre liberdade artística e sucesso mercadológico está intimamente relacionada à especificidade dos agentes por detrás da manutenção de marca do artista. Em termos práticos, isso quer dizer que uma equipe que vende arte abstrata não necessariamente vende Pop Art com a mesma maestria.

A massa como audiência 

Ao nos colocarmos a pensar sobre o papel da sociedade de massa no mercado de arte, podemos encará-la de três formas distintas. A primeira é como a audiência global, na qual todo e qualquer artista que tem a pretensão de fazer com que seu trabalho transcenda a reflexão e traga uma mudança na sociedade, busca atingir/chamar a atenção com o seu trabalho. Um exemplo disso foi a obra Vale (baleia) do coletivo belga Captain Boomer. Nela uma baleia hiper-realista foi colocada às margens do rio Sena, como cita a notícia de Márcia Bechara: 

O coletivo Captain Boomer, criado em 2007 na Antuérpia, na Bélgica, […]. Em seu site, o grupo diz que a baleia é uma “metáfora gigantesca de destruição do nosso ecossistema.” “Em contato com a obra, as pessoas sentem que a ligação com a natureza foi perturbada. O jogo entre ficção e realidade reforça essa sensação de desordem”, explicam os artistas belga. […] segundo o coletivo, trata-se de um trabalho de dimensão educativa. “Durante essa instalação, quando a ‘baleia’ encalha, acontece uma forte interação com o público”, diz o grupo em seu site. “Isto atrai e mobiliza a comunidade local. As pessoas falam, especulam as causas do encalhe e admiram o animal”, explica o grupo Captain Boomer

No caso, podemos notar uma preocupação em impactar a maior quantidade de pessoas possível. Os efeitos “colaterais” desse tipo de ação são: a relevância e a procedência que o grupo passa a levar consigo.  

  1. A MASSA COMO MENSAGEM E PúBLICO ATRELADO   

Em um segundo caso, podemos entendê-las como motores da indústria cultural, isto é, podem, por um lado, não necessariamente adquirir as obras originais, mas, por outro, compram diversos subprodutos das obras, que vão de canecas e chaveiros a reproduções numeradas das peças – que garantem ao artista um espaço no imaginário popular. Um exemplo disso são as diversas linhas de produtos de Romero Brito, que, segundo nota na revista Dinheiro possuía na época (2011) mais de 200 produtos licenciados.

“É impressionante o sucesso de Romero Britto, que possui mais de 200 produtos licenciados com sua marca. Além da galeria, que faz muito sucesso, na Lincoln Road, em Miami Britto tem três lojas nos navios da Royal Caribbean e outras nos aeroportos da Florida: até 2013, serão dez. Romero Britto terá exposições em novembro e dezembro em Viena, Londres. Berlim e Munique. Suas telas podem custar de US$ 30 mil até US$ 500 mil. Aos 48 anos, este pernambucano é um talento da pop art e na arte de ganhar dinheiro.” (Ferreira, C. Lideres. Revista Dinheiro, São Paulo, p. 28, nov. 2011. Editorial)  

Podemos, aqui, fazer uma analogia do conceito de Benjamin, no qual o autor desenvolve a dinâmica entre o valor de culto e valor de exposição; com Britto, a estratégia é utilizar de toda ”munição“ possível dentro da indústria cultual para se destacar através do culto, desenvolvendo um sistema Desejo/Exclusividade, no qual o principal atributo de sua obra é atestar o poder.

Nesse sentido, podemos entender a criação de subprodutos com pouco ou nenhum lucro, como agentes “educativos” para “evangelização” da massa. Em outras palavras, “uma maneira de ensinar a massa sobre aquilo que a “oprimirá” e o que deve ser considerado um objeto de poder”. Além do desenvolvimento de produtos, Britto também é conhecido por presentear pessoas de grande poder e destaque com retratos. Entre os nomes estão Michael Jackson, Princesa Diana, Dalai Lama, Jeff Koons, John F. Kennedy e Jacqueline Kennedy, Dilma Roussef, Barack Obama, Mao Tsé-Tung10 e tantos outros. 

Ao presentear esses “influenciadores”, Britto forma no imaginário de seus compradores, um perfil de seu público consumidor; é como se adotasse um discurso que mostra o “cacife” – no sentido mais pleno do termo, que, por um lado, para grande massa, garante o status do artista como notório, e, por outro, para os colecionadores, novos e emergentes, se reafirma como um símbolo e uma marca de poder, legitimadora de status e pertencimento. 

Da mesma forma que na era absolutista um rei católico legitimava o poder da igreja, e, ao mesmo tempo, a igreja provia legitimidade para o rei – alegando que Deus o havia escolhido para o cargo, no mercado de arte não é diferente. Quando um artista (assim como a Igreja) garantir legitimidade (pertencimento) a um rei (colecionadores de marca/mercado), a Igreja (artista) terá uma nação de fiéis (massa) e uma classe burguesa (colecionadores emergentes) como sua vassala.  

Britto também trabalha com diversos outros tipos de ações e projetos especiais que vão desde rótulos de bebidas , jogos de tabuleiros, incontáveis esculturas, personalização de carros e aberturas monumentais de eventos (Super Bowl) . Todas essas ações fazem com que a massa conheça e reconheça Britto e suas obras. Parte do sucesso de sua estratégia está relacionado ao uso de símbolos (marcas e eventos) já consagrados para as massas como Super Bow 19, Audi e o Carnaval do Rio de Janeiro. 

  1. A ARTE COMO DISCURSO POLíTICO/IDEOLÓGICO 

Já em um terceiro caso, podemos entendê-las (massas), ainda, como motores da indústria cultural, mas nesse caso, diferentemente da “imparcialidade” de Britto, busca-se um discurso político/ideológico. Nesse cenário, podemos citar o artista VIk Muniz.

Muniz possui como característica o uso de materiais reciclados – não necessariamente sucata – como matéria prima do seu trabalho, sua obra deriva desde serigrafias, fotografias e esculturas, até documentários. ” Seu processo de trabalho consiste em compor as imagens com os materiais, normalmente instáveis e perecíveis, sobre uma superfície e fotografá-las” (Escritório de Arte).

Sobre seu início de carreira escreveu Carlos von Schmidt em 2001: 

“De volta aos tempos da molduraria, paralelo às pinturas kitsch que fazia para ganhar uns cobres a mais, começou a fazer esculturas, estranhas e incomuns. Foram essas esculturas que abriram-lhe (sic) as portas do circuito de arte nova-iorquino. Fotografá-las para poder mostrá-las a possíveis interessados, levou-o à fotografia. “ (Bolsa de Arte)

Dentro da perspectiva da formação de marca, Muniz foca em um “segmento” muito mais voltado ao discurso ecológico do que tão somente ao mercado de arte. 

Como resultado desse posicionamento, tem maior aceitação dentro do mercado de projetos culturais para empresas; que, por sua vez, podem buscar não somente agregar à marca a visão de patrona das artes, mas bem como ao posicionamento de responsabilidade ambiental. Não raras vezes, artistas com esse perfil não se restringem apenas a patrocínio de mostras para o grande público, mas atuam nos mais diversos níveis da empresa, desde obras que decoram os escritórios dos principais executivos, como também suas obras são utilizadas como presentes para estreitar relações com “colaboradores”, até mesmo desenvolver peças com os produtos reciclados da empresa, como por exemplo, a obra exposta no Edifício Conjunto Nacional de Silvio Galvão, denominada de “Dom Quixote de La Mancha” .

Em entrevista ao canal digital Novo Olhar Sandro Rodrigues mestre artesão da obra citou: 

”Essas peças agente consegue em vários lugares na verdade, porque o lixo se encontra em toda parte, mas agente ia muito em deposito, aqui do conjunto nacional saiu grande parte também dos materiais, então agente ia atrás onde precisasse” (grifo nosso).

Notamos aqui, uma proposta muito semelhante à de Muniz, exceto, pelo fato de que o artista não tem desenvolvimento de marca no mercado de arte, o que, do ponto de vista da instituição que encomendou a obra, pode não fazer tanta diferença; falamos isso não como uma maneira de menosprezar ou desvalorizar a arte de Rodrigues, mas dentro do fato de que a mensagem a ser passada pela instituição é muito mais “somos ecológicos” do que “somos cultos e apreciamos a boa arte”. 

Em termos práticos, diretos e nada românticos, isso significa que, nesse caso, não foi necessário gastar infinitamente mais com uma obra de Muniz que, por sua vez, envolveria muitos custos de manutenção, como seguro, restauro, transporte e segurança, além do preço da própria obra – o que resultaria em menos tempo de exposição, culminando em menos impacto para a instituição benfeitora, sendo que a obra de Rodrigues exibe uma estética muito mais “clara e crua” em relação ao que se pretende apresentar. Permite também aproximação física maior do grande público, possui manutenção infinitamente menos burocrática; isso sem mencionar o fato que os visitantes do edifico Conjunto Nacional não reconheceriam, em primeiro momento, que se trataria de um Vik Muniz, o que a instituição buscava nesse caso. Ou por necessidade legal ou por necessidade mercadológica, era um monumento, não necessariamente uma obra prima.

O que buscamos dizer com isso é que, incialmente, quando pensamos em marca no mercado de arte, logo nos vem à mente, grandes artistas internacionais com seus luxuosos catálogos e suas requintadas vernissages, porém, não obstante, os verdadeiros ringues das marcas do mercado de arte estão onde a audiência de cada obra se situa. Isso está muito menos ligado à uma declaração de que o artista deve apenas produzir dentro dos parâmetros esperados pelo mercado e muito mais ligado ao fato de que ele deve contar com uma equipe de profissionais que conheça as diversas demandas, nas quais suas obras se encaixam. 

Nesse cenário, vale trazer a reflexão sobre o debate em relação à singularidade e inovação em sua matize estética. Inicialmente, podemos pensar que manter linearidade estética pode acabar podando a criatividade do artista – já que, ao não experienciar novos materiais, o artista restringe seu potencial, mas ao mesmo tempo não ter qualquer linearidade (estética ou conceitual) , também faz com que perca valor de marca e mercado (há exceções), uma vez que encaremos obras de arte como símbolos de status, “demandam” um acordo entre as partes sobre o valor daquilo que é exibido, nesse caso, a abstenção completa de linearidade  faz com que o entendimento do objeto exposto seja comprometido. Podemos trazer como um exemplo de um artista que mantém por completo sua linearidade como On Kawara como cita Don Thompson (2012, p. 24):  

“Veja-se a atração de uma obra feita pelo artista conceitual japonês On Kawara, cuja série Today [hoje consiste em pintar uma data na tela. Assim, a obra Nov. 8, 1989 (apenas as letras e os números, num bloco branco sobre um fundo preto), em acrílico Liquitex sobre tela, 66 x 91 centímetros, foi vendida por 310 libras em fevereiro de 2006 na Christie’s de Londres. Kawara pinta à mão livre, e se impõe o limite de 24 horas para terminar um quadro. Ele descarta a pintura que não estiver pronta à meia-noite, pois não seria mais a pintura daquele dia. Todas as pinturas são feitas aos domingos. Se Kawara está nos Estados Unidos, a data começa pelo nome do mês em inglês, e a seguir vêm o dia e o ano. Se está pintando na Europa, o dia vem antes do mês. Se está num país que não usa o alfabeto romano, ele escreve o mês em esperanto. Cada venda inclui a primeira página de um jornal daquela data. O catálogo da Christie’s apresenta a obra de Kawara como “uma declaração existencial, uma prova de vida”.  […] Kawara vem fazendo essas pinturas desde 1966. Existem 2 mil quadros do “dia de hoje”. Mas a é uma marca, e seu trabalho de gestão de marca é uma uma referência para todos os marchands contemporâneos e todos os aspirantes a artista conceitual.” 

Por outro lado, temos artistas que não seguem uma linearidade estética, pelos mais variados motivos. Um exemplo disso é o dadaísta Marcel Duchamp, que (simplificando) não objetivava que em sua obra houvesse qualquer sentido, trabalhando, ora com um mictório, ora uma releitura da Monalisa de Leonardo da Vinci.

Nesse cenário, percebemos a importância de bons agentes que têm como função encontrar nichos de mercados para as novas obras, de elaborar estratégias e aparatos para comunicar/apresentar a nova estética ao mercado – tanto aos novos colecionadores, como também aos já experientes. Com isso, podemos aferir que a relação entre liberdade artística e sucesso mercadológico está intimamente relacionada à especificidade dos agentes por detrás da manutenção de marca do artista. Em termos práticos, isso quer dizer que uma equipe que vende arte abstrata não necessariamente vende Pop Art com a mesma maestria.

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